24 de novembro de 2008

A.Artaud.

O que é a motilidade ?

É o poder de fazer se
si mesmo corpo
em função

de uma vontade
de rapacidade,
de bestialidade,
de brutalidade,
de força,
de contenção,
de dignidade,
de honra,
de desonestidade,
de arbitrário,
de intensidade,
de obscuridade,
de apagamento,
de reserva,
de abstenção
de contracção,
de privação,
de cupidez,
de afastamento,
de desinteresse
e de dor,

a qual
vêm da rotação vertical de um corpo desde sempre constituído e que num estado além não cessa de se endurecer e sobrecarregar pela opacidade da sua espessura e da sua massa.

O critério é o chumbo inerte da contracção plena de um puro estado de desapego, de desinteresse feroz
que permite nada sentir de qualquer ideia, sentimento, noção, percepção.

Antonin Artaud ; Textes écrits en 1947 ; Oeuvres.

21 de novembro de 2008

L. Wittgenstein.

Numa corrida, o touro é o herói de uma tragédia.
Primeiro é feito louco de dor. Conhece, de seguida, uma longa e terrível morte.
Um herói olha a morte de frente, a morte real, não simplesmente uma imagem da morte.

Agarrar se durante uma crise não quer dizer ser se capaz de desempenhar bem este papel de herói - como num teatro - quer dizer ; ser capaz de olhar a morte, ela mesma, nos olhos.

Pois o actor pode desempenhar uma quantidade de papéis mas no fim é preciso que morra, ele mesmo, enquanto homem.

20 de novembro de 2008

Plácido o dia a tempo
seco o sol quente,
outonal ;

de reposta memória numa coloração,
de domingo o próximo odor, atento
o desdobrar do alcance ao mundo assim,
como que nos caminhos descalços, nus

num vago alinhamento,
do correr adormecido,
que vê se em tempestade
... lá mais para a tarde.
Rumor na hora da cidade.

Após da noite o passar febril
e vêm gélido ao clamor do sol novo
o correr largado ao dia a continuar,
do sono, numa sua cegueira,
e a via larga a vida ao fervilhar
claro, e a esta hora do rumor.

Sempre a cidade acorda qual véu lançado numa intensa idade do feito,
aqui, num correr que atingida é da miragem mecânica e surda, sensual,
desfeita em dia da pele e das cores, dos expressos, do excesso da vida,
e dos corpos, do sangue a como num fugaz palpitante pôr plácido dos olhos,
solícitos, e feitos, a um ganho ou num arfar e forte o desta hora, que desperta,
como que num animal que se desse, solícito, afecto.

17 de novembro de 2008

O rio.

O reflexo fasto, a esbatida luz,
o crescendo aquático cintilar que voga,
o pré disposto tornar, desperto,
o tempo, apossado de insinuante abertura.

O corpo a ficar, o olhar perto.

Como numa aceleração da temperatura ao descalabro ou o mundo a quente numa transformação, solúvel.

10 de novembro de 2008

Águas de cinza,
ao longe, as curvas em colapso
frio, o reflexo da qualidade nocturna.

E o entrar, da prata,
um espelho, as facas,
as ondas do aquático, mar, baço.

Das linhas, distante, ocorrido,
é claro, o clarão das brumas,
das bermas à deriva.

Do rio, a substância,
em mover, musical,
fuga da solenidade, ligeira
numa sua imposição,
que navega o de correr,
e marcado, o grita,
dela, o riso à sua presença.

Da vida, do fazer se,
à sombra,
o navegar destes magníficos
apenas num tom, de prata,
escuro, baço, reflexo
estendido na noite,
como horizonte,
de um pensamento,
inútil, como de tal cantiga,
repetida, nesta noite, baça.

Numa demora, nem ausência,
na vida, clara imagem,
tomada, apenas tela,clareada.