Diálogo de sombras.
- Propões-te então.
- Está feito, fica o digerir.
- Compreendes então, tens a matéria. Se bem me lembro propunhas-te dois.
- Quando me decidi queres dizer?
- Se assim lhe quiseres chamar.
- Propunha-me realmente dois como dizes, compreendo que é apenas um, único, obviamente com duas faces.
- Bom. Mas faz tempo que sabes isso.
- Sim, apenas busco, se é que busco alguma coisa, uma forma, uma diferente forma, digamos assim.
- Quer isso dizer que compreendes o campo, a função da figura, esse que era, afinal, o grande tema que procuravas, distinto do outro, será que consegues objectivar, afinal de contas existe mesmo uma separação a fazer, na minha opinião.
- Sim, percebo. A figura, como lhe chamas, separa-se. O “erro” consiste nesta ser tomada específicamente na (sua) função genérica, dentro (fora) do signo, quero dizer, o signo é o signo, afinal, genérico.
- Funda. Talvez aí tenhas uma direcção, confusa no entanto, esse erro de que falas, adivinho que lhe chamarias outra coisa, é apenas e afinal, uma função do signo de que falas e que a tem executado, quero dizer, parece-me que continua a exercer a sua poderosa força.
- É afinal uma grande palavra e funciona, tem funcionado.
- Funciona e é real, cabe-te resolver. Estou curioso, creio que já te ocorreu, ou “passou”, o signo.
- Desde o princípio, sim, sorriso, afinal, como disse, o signo é o signo, e um homem tem que fazer o que tem de fazer, novo sorriso, e o tema das palavras separa-se, assim, nos seus sentidos, genérico, específico, que são devolvidos à sua, própria, significação, à sua, própria, realidade. Toda a informação já não conta, basta neste trabalho.
- Sim. Faz tempo.
- Em suma, a função genérica da figura vem a subsumir-se no signo, quanto à específica, esvazia-se da sua carga, o signo é o signo, repito, creio que cheguei muito longe neste trabalho, mas afinal, uma afinidade é uma afinidade.
- Que significarão todas essas tautologias. Uma ordenação talvez. Uma separação das águas.
- Sem dúvida que é uma separação das águas. É difícil.
- Começo a reconhecer-te, pensas em mecanismos muito complexos, muito simples.
- Penso um sentido de espera.
- Hm, sim, não te deixes distrair, atinge, pensas em liberdade talvez, arrisco num sorriso.
- Sim, nesse sentido em que pensas, sorriso também, afinal as coisas são como são.
- Continuas a tautologizar vejo, se bem entendo essa espera é por aí que não te diriges.
- Sim, penso em liberdade nesse sentido, a dúvida que fica.
- Creio que por aí te enganas, (o (ser ou não ser dessa existência) existir ou não da dúvida não é relevante), isto é, se bem entendo o sentido que lhe dás.
- Sim, claro que entendo o que queres dizer, já o disse.
- Sim, disseste, utilizaste as tautologias, é curioso.
- Afinal de contas o tema existe, a dúvida também, (até como critério dessa existência), mas apenas o (que é do) signo é o signo, não lhe chamarei mais nomes mas afinal sabemos do que falamos.
- Compreendo, ficas mais leve.
- Também temos que nos distrair.
- Executas a minha função agora, sorriso.
- Bom, afinal trata-se de uma colaboração, ou não, outro sorriso.
- Efectivas, pareces não querer ficar.
- Fui muito longe, como disse, o signo está disposto, eu é que não estou, é um trabalho difícil, duplamente difícil.
- Um trabalho de signo, a tal liberdade de que falavas, ou falava, já não sei, sorriso.
- Ouvimos falar destas histórias, noutros contextos, suponho.
- Talvez te tenhas apercebido disso, ou talvez não seja de todo assim.
- É irrelevante.
- Fica-te a tal espera, (a tal liberdade), é trabalho.
- Sim, existe uma certa dispersão, pelo menos.
- Percebo, não concordo no entanto, ficaram lacunas, voltemos atrás, ao específico, ao desenvolvimento, bom, quero dizer, afinal temos um núcleo.
- Dizes temos,é curioso, sorriso.
- Sim, temos separação na afinidade, espera, como lhe chamas, e integração daquilo que é do signo, no signo, “a César o que é de César”.
- É uma separação das águas, de facto, o que na afinidade, na figura, no tema, é do signo, integra-se-lhe, fica então a tal espera, um certo esvaziamento.
- É um curioso conceito esse teu de espera, interessante, lembra-me qualquer coisa que li num ou noutro sítio obscuro, as mais obscuras palavras sobre a acção, alimento e acção, o tal mecanismo complexo, simples, de que te falava.
- Sim, a espera, quanto a mim nunca me consegui descrever a solução desse mecanismo, tenho-o guardado para mais tarde, quem sabe.
- Sim, sim, talvez não possa ser descrita, assim, nesse sentido, existe no entanto uma solução, tu conhece-la, lembro-me de uma situação em que alguém expressava a sua perplexidade pela aparente ausência de método onde era suposta a sua existência.
- Sim, não existe efectivamente um método, nesse sentido, e esse é, de facto, o único e verdadeiro método, ou seja, essa solução talvez não possa de todo ser escrita, descrita sim, em ligação directa, ficam o negro, a sombra, os silêncios escritos, já a vi, li … creio que no mesmo local dessa perplexidade, ou por aí.
- Seria talvez necessário ser um extra terrestre para entender isso, sorriso, suponho, mas adiante.
- Fazes humor negro, enfim, mas sim, adiante, digo, o erro, a figura e o trabalho, sempre estiveram, neste assunto, verdadeiramente, do lado da afinidade.
- Sorriso, o segundo hadith.
- Ironizas mas o caso é sério.
- Voltamos ao mesmo, erro, tema, figura ou afinidade, como lhes queiras chamar, são um percurso natural que, dada a natureza do mesmo, erro, tema, figura ou afinidade, passa por uma certa cegueira na relação ao funcionamento do signo. Tu sabes isso.
- Sim, sei, isso que chamas cegueira é uma ligação directa, como disse, um acto supraracional que radica na mais lúcida das decisões da acção, duma profunda reflexão desta, ou seja, a ser feito, dessa maneira, teria que ser dessa maneira, é difícil, como disse, repito, não é relevante o erro agora, tinha de sair à luz, de existir, do que se trata, agora, é de liberdade, neste sentido como disseste.
- Nem mais, compreendo-te bem embora o fizesse de outro modo.
- Bem sei.
- Baralhando em absoluto e resumindo, as palavras, trata-se dessa tal espera associada à reintegração da parte genérica do tema no signo.
- Sim.
- Qual dos trabalhos consideras prioritário.
- São simultâneos, enfim, talvez a espera… enfim, é uma história antiga, como sabes.
- Sim, sei, creio que deverias focar-te na devolução do signo, a tal integração, até porque trabalhas simultaneamente a espera, se é que a entendo.
- Sim, foi o que disse, a separação dos trabalhos é vaga, apenas se justifica aqui, se é que se justifica de todo.
- Chegas então de novo a um tal especial lugar.
- Pois, continuamos por aqui a deslizar, num esvaziamento à força.
- Um esvaziamento específico do tema, quanto ao signo, já reparaste que não usamos sinais de interrogação, porque será.
- E integração da parte genérica, sim já reparei.
- O tema perde a sua face, a figura.
- Nem mais.
- Não implicará isso um certo…
- Não, o trabalho é esse, quer dizer, no sentido que acima lhe atribuía.
- Hmm... é só fazer.
- Sim, é só fazer, numa certa silenciosa maneira, num sentido muito especial.
- Afim.
- Não só isso, chamar-lhe-ia uma liberdade agente.
- Uma exaltação, ou pelo menos um certo tipo de exaltação, específica.
- Também por aí já que estamos em maré de confundir as palavras.
- Percebo.
- Sem dúvida.
- E o tal esvaziamento.
- Sim.
- Não sei se percebo.
- Afim.
- Sim, agora és tu que ironizas, percebo.
- Como um divergir afim da acção, liberdade, neste sentido agente, cessa de existir contradição entre o signo e o tema pois ambos estão, essencialmente, neste afim.
- Pois, mas enquanto não existir simultaneidade não terás a “afectivação” desse afim, e tomo desde já esse afim num sentido um pouco diferente, mais depurado.
- Falaste bem, o trabalho tende para uma produção, depuração, afim, um agenciamento pelo próprio acto da expressão.
- Especificamente, um agenciamento das operações afim.
- Agenciamento de um composto afim.
- Sim.