10 de outubro de 2012


esta época
do despedaçar de um povo
não é feita
para a poesia
nem para esse tipo de coisas:
quando nos preparamos
para
escrever
é
como se
escrevêssemos
sobre a outra face
do participar
do sofrimento
e eis porque
os meus poemas
são cheios de azedume
(no fundo, o que se pode mudar?)
e sobretudo
tão
raros


Nikos Engonòpoulos – “Eleusis” – (trad. livre da trad. francesa)

9 de outubro de 2012


A Cigarra e a formiga.

Num dia de inverno uma cigarra esfomeada pediu a uma Formiga um pouco da comida que esta tinha armazenado.
- O quê? – disse a Formiga – Não trataste de armazenar alguma comida para ti , em vez de estares sempre a cantar?
- Assim fiz – respondeu a Cigarra -, assim fiz; mas as tuas amigas entraram por minha casa adentro e levaram-ma toda.

Ambrose Bierce – Aesopus Emendatus – Antígona (trad. Fernando Gonçalves)

Feliz da lua que em canto passado grita os fundos da rouquidão tranquila.

O nome em silêncio falado.

Um travo de sol desponta na manhã o soletrar do desconcerto aos descobertos espelhos.

Desdobram, atravessam, a nauseante película do cerco.
O inesgotável reservatório das combinações.
As alinhadas danças dos resíduos.
As grosseiras linhas tomadas na ostentação cega da maquinal vaidade.

O insurgir da decepção nas manhãs em que sopra, sem se saber de onde, um miraculoso advento de cidade, faz trazer assim, alinhado, o que vai-se a fazer em dourado atrofio da demência. Socorrem-se as longas danças do horror e da devastação.

E não se trata (aqui) de entoar os solfejos da anarquia.

Nas longas manhãs das fontes e das facções, os rebentos em assimetria, fazem fútil vampirismo dos sonetos cravados na aspiração.

8 de outubro de 2012


Assola essa ausência. Já não lembro. Chegado em espanto o torpor (me) terminará na indiferença da voz que cala o corpo de vez. Um fundo de beleza. Instantes, avenidas, multidões. O olhar destacado floresce a maneira do pensar um mundo. Basta olhar a voz no silêncio para que se ponha sentido.

A carícia de passagem.
O residual de todo o discurso.

A verdadeira história é feita de curtas palavras. De silêncio. De sobrevivência. De uma crueldade ancestral. De rápidas imagens reveladas na plenitude de uma intensidade dramática.

Cantos de ilusão.
Marcados na carne.
Em velada intenção.
Do positivo animal.

6 de outubro de 2012


Uma paz. Uma guerra.
Ao estender (mais) remoto.
Pertence. A noite.
E o desencanto em que traz.
(A personagem).
Apaziguada ao amanhecer que encontra.
O esgotado corpo cadente.
Na luz dos olhos apagados.
Por mensagem do leve incentivo.

Solene e breve mente.

Poderia aspergir todo um elenco. Um preparado de alienação.
O imenso caudal das microscópicas imagens que fluísse as vias corporais do engenho.
E da arte. Corresse a ilusão e tudo recomeçasse.

Pois pode ser o que dizia-se da imagem da adoração.
Perto instante a que não chegassem palavras para fazer em nós pedaços dele.

Furiosas marés revoltas.
Tomai-me em paz.
No convém.
Do agradecer embevecido.
E reverente mente.
Retirado em face desse “dom”.

5 de outubro de 2012


A suspensa expressão da espera assenta no instante o rosto crispado.
(É preciso ver para lhe fixar a palavra).
Pois o muito tempo é relativo, tudo foi dito.
Impresso no rosto como a salvaguarda do privilégio.

Um peso que adormece, revela na voz, o “mistério” do jogo e da hierarquia.

Na hora do regresso, plasmado, um irisado gatilho arbitra a ligação duma ausência em suposta situação do vendaval reflexo.
Natural solução doutra ideia. O olhar sentido aqui.
De fonte ao alto rio a rebentar num movimento atirado ao quadricular lugar da sonora perversão da palavra.

Já!

Sombras irrompem das antigas imagens manifestas à luz presente.
Ares do destino, diz-se.
Chega-se o fim no revelar das imagens escondidas.
Ecos de selvajaria, a progenitura do sacrifício.
A imensa história dos círculos da silenciosa brutalidade.
Cegas manobras. O sangue perdido.
O deslizar na distribuição das palavras
Ao sabor das fúteis edificações da memória do paradoxo vivo.
Últimas tábuas da inscrição.
Os altares da mais ancestral violência.
Os antigos gritos.