A Espiral Selvática (anotada)
(Amor é paixão civilizada!)
Era por cerca do sol da manhã quente e seguia nessa rua estreita/íngreme que ia à casa feita luminosa... do sol. Plácido, absorto, ali buscava o que lhe evidentemente escapava... Íris dos verdes vagos olhos desce em labaredas de ausência e logo ali retém o vilão sereno que interpela :
Íris - Em que vagueias e crês vilão?
Serão magias, destinos?
Sem dúvida um desconforto
pois eu digo das almas,
dos sentidos,
das intuições totais,
plurais.
O Vilão espantado do reconhecer faz as elevações da prudência, a saber; é como que vilão piedoso.
Vilão - Pois seja que bem o dizes
e venho aqui, sou.
Bela Íris, soas tão prazenteira.
O Vilão fazia de agarrar suspenso o momento em que via (a) magia e era um sonho de Íris. Um sonho irisado sem dúvida, o que, por si, já sabia, já é ... e assim foi adiante.
Íris - Pois nada mais intenso vilão
e é assim que te reconheço,
sim!
É neste momento que eu sinto.
O Vilão retrai-se, calcula.
Vilão - Que dizes tu aqui Feiticeira (1)
dos perigosos verdes olhos?
Íris - Para ti Vilão?!
Dizes então o regresso
e recusas o momento,
a reunião?
Vilão - Digo o que digo e és bela,
selvagem,
ausente.
O Vilão em sua torre atingido sacode brutal e é Íris que enlevada tão certa. (2)
Íris - Venho de estar ausente (3)
nas dores do pensar
e é nostalgia dos regressos,
a ti, antes do medo,
do mundo, vês? (4)
Vilão - Sim.
Mas por bem
que não vejas teu espelho,
em mim. (5)
Íris – Bem me sei selvagem
e desses limites.
Vilão - Que te impões,
e não de mim,
que eu não sou limitação.(6)
Íris - Pois careço se o quiseres
do sentido que me és. (7)
Fitam-se enlevados nos olhos de emanação das voltas que ecoam nas espirais.
O Vilão beija os verdes olhos
Íris - Sabes que me dou imagem
e sou perdida.
Vilão - É grande o regresso
e é trabalho o que dizes.
Íris - Falas bem vilão,
como um belo arquitecto.
Vilão - Arquitecto selvagem decerto.
Íris - ... e o nosso primeiro
eterno motivo,
saberás dizer?
Vilão - Agora és mulher.
Íris nos verdes olhos de si tão cheia na espiral que ri enamorada nas suas doces voltas.
Íris – Sim,
apenas sou mulher.
Vilão - Livre
como selvagem pode ser. (8)
O meu caminho quero ver,
pois as grandes palavras fazem-se.
Íris - E digo aqui o regresso.
Tolhidos tomam seus corpos de transformação na espiral que transpira dos poros.
Vilão - Um regresso a ti
que bebo no esquecimento.
Íris - Celebremos então
que a espiral ecoa doce e
a fazer desse trabalho é
que à Deusa eu agradeço
do que eu sinto e ser mortal. (9)
E não receio perder o chão. (10)
Vilão - Dizes do que és
e eu regresso suspenso,
tocado.
Íris murmura os ouvidos do vilão na espiral que adormece.
Íris – Regresso
os falares de amor
e sem medo em ti.(11)
Vilão - Belas palavras
de néctar e esquecimento
e o trabalho é imenso.
Íris - ... de amor Vilão.
Das grandes palavras artesão.(12)
Vilão - Faço por ser da vida,
agarrar, a saber,
do momento.
Íris - Assusta-me onde vais
pois é do total que eu sinto (13)
e é a vida
e já nada é mais
e nós dois
o que é tão doce.
Vilão - Pois que nos vamos a ter
no trabalho que nos espera.
Íris - Só mais um pouco
deste abandono tão doce
em que eu aqui
tu próprio fosse,
tu,
que és todo de mim
meu vilão
e em ti
eu a mim necessito
e vejo e inicio
o trabalho.
.
Fundem-se selváticos nessa hora da espiral que ecoa desordenada em suas voltas.
Vilão - Pois por magia são limites
na causa de tantas correntes.
Íris - Sei que és tu
e que é tudo.
Vilão - Que é tudo
e que é nada.
Íris - Tenho amnésia de nada,
eu,
só quero o nosso regresso.
Vilão - És bem mulher
e eu sou vilão
e tenho de saber a razão.
Íris - Que temos só de fazer.
Vilão – Íris pragmática.
Íris - Uma tonta enamorada
e sei dessa magia
na matéria do que temos.
Vilão - Cerrados em selvajaria,
indefinível esquecimento.
Íris - Sim,
e que é amor,
ou sou errada?
Vilão – Grandes palavras
que adiante saberemos,
talvez,
dizer.
Chegados nessa encruzilhada em que se diz do que se faz os raciocínios são assentados na espiral que ecoa.
Íris - Pois sei que é amor
e que o digo.
Vilão - Selvático,
sinuoso,
em suas voltas impiedoso
e é nesse o nome
em que eu te espalho.
Íris - Sim Vilão.
Vilão - És feiticeira
e fera do momento.
Íris - É que amo vilão e sempre e sem limite.
Íris dança gargalhadas na leveza dessa essência da espiral que ecoa os rios negros nos olhos do vilão.
Vilão - Quero-te!
própria matéria selvagem
de criação.
Íris - Matéria desconfortada (14)
pois são civilizados comércios.
Vilão - São as razões dos espaços
o que é muito espanto.
Íris - Pois não sossego vilão.(15)
Vilão - É prudência
nas correntes claras
a nossos olhos. (16)
Íris - Pois o quê vilão?!
Sei que sinto,
não chega dizer?!
Vilão - É que são espaços de morte.
Íris - Religações alugadas
de tanta fria civilidade,
hipotecas.
Sabes Vilão,
eu orgulho o ser selvagem.
Vilão - E que te quero assim.
Íris - E porquê o não dizes Vilão?!
Pois que o é total
e que eu faço
o que eu já não sei
o que eu digo, digo. (17)
Íris plasma tão pasmada e pois quer ser do vilão, das suas negras voltas.
Vilão - Pois é brutal momento
o dessa escolha prudente.
Íris - Escolha Vilão?!
Pois o que eu tenho é urgente
e dizes saber oportuno?!
Vilão!
Vilão - Ironizas em vão
dos imensos glaciares.
Íris - Pois não me interessa
e assusto os medos (18)
e brinco e não careço
dos limites e desafios.
Vilão - A devorar
e digerir. (19)
O Vilão atinge a sua razão nas negras voltas da espiral que ecoa.
Íris - A saber não quero
pois sou contigo,
completa.
Vilão - Resguardas-te desse nó?!
Adivinhas (d)onde nasce?! (20)
Íris - Tenho medo
e não quero passar,
eu sou daqui,
selvagem. (21)
Vilão - Já o não és morreste,
lembra-te, pois,
do voltar que faremos
no imenso edifício
da nossa selvagem civilidade.
Íris – É pois tudo tão confuso
neste tão imediato indistinto,
é já. (22)
Palavras do rubro vilão:
Vilão - Assentámos a matéria
das artes de navegar
e fixo-te então etérea
na coragem de desvelar.
Íris - Eu tenho um amor selvagem
eu tenho um som original,
um suave, doce, fino arrepio.
Vilão - Que bem dizes,
de amor.
A espiral selvática ecoa ritmada nas suas cadências.
Notas por N.R.
1-O Vilão sente o perigo que significa o apelo de Íris, (que é um sentimento de previsibilidade e consciência) e que, a ser seguido, significará um salto no vazio e no negro da morte. Digo que é um sentimento (de) complexo pois se bem que este efectivamente o desconheça, ou antes ao seu desenrolar, (num plano humano de conhecimento, dizia) este apelo gera-lhe por um lado a força sincera e animal da precipitação (a paixão) e por outro o complexo propriamente dito, a coloração humana da morte e do amor, do compromisso”- essas ”civilidades urbanas” - como à frente dirá Íris. Ou seja ; a projecção formal do contrato social do amor. Cabe ao Vilão reconhecer a construção virtual e condicionada dos campos pré-fabricados, por um lado, e a totalidade do instinto animal por outro. E penso, eu, que o Vilão se encontra suficientemente desperto do aproveitamento que se faz destas ambiguidades e daí também a sua ambiguidade embora, na minha opinião, se entretenha, até certo ponto, no cálculo dos” jogos das correntes”.
2- Íris está certa, sim, da paixão a que chama amor, antes, a certeza de Íris é exactamente a certeza da constatação, nesse momento, da formalização do – seu – caos, da sua ausência, naquele ponto Vilão que, a partir desse mágico momento ausente se torna, efectivamente, amor. É como uma primeira formalização da paixão caótica e informe de Íris. É um compromisso de difícil resolução que se apresenta nestes dois que se querem. O Vilão, formado de informação que deseja Íris, cauteloso, e Íris, informada de formação que quer, o Vilão.
3- Estar é uma palavra com uma conotação e coloração sonora que me agrada e que me parece bem apropriada a Íris e ao que ela sente. Íris poder-se-ia chamar : “Estar”. Ah ,Ah!
4-Íris aparenta não estar certa do objecto do seu medo. É como se quisesse convencer o Vilão de que têm medo, de algo ; será que Íris, no seu jogo de sedução, plasma um medo que efectivamente pertence ao Vilão? É, no entanto, Íris que o diz. Será que na sua intuição sedutora se oferece no papel de ”símbolo de transferência”, como espelho?
5-Será que na realidade se trata de uma (eventual) inversão subtil e que nesse caso não será Íris que toma espelho no Vilão mas o inverso? Que significa esta dupla inversão de sentido? Claro que Íris não irá ver seu espelho uma vez que, efectivamente, se está a oferecer, antes, como espelho do Vilão. - Não diz Íris: “Antes do medo e do mundo...Vês?” - e digo eu: Antes desse medo do mundo do mundo, vês-te Vilão? Como eras, quando éramos, um só; Estar! É como se Íris plasmasse as colorações “complexas” do Vilão por força a desencadear o Amor, da Paixão. Como se Íris reflectisse em si os desvios entre ditos do Vilão.
6-É como se o Vilão se descartasse, mais uma vez, da imagem que se lhe apresenta como que num écran, um efeito de écran.
7-Será que Íris carece, efectivamente, do sentido que afirma ser-lhe o Vilão? Pois não diz se sentido apenas se este o quiser? Dir-se-ia, mais uma vez, que Íris joga sedução no Vilão e de uma forma que já não é assim tanto subtil. A carência de Íris está dependente da vontade do Vilão, é uma relação relativa e a vontade efectiva está aparentemente do lado do Vilão, ou seja, Íris quer ser limitada e é esse o sentido, e é neste sentido que o Vilão lhe surge como justificação e espelho. Íris joga e seduz com as palavras afim de transformar limite em sentido.
8-Dir-se-ia que o Vilão desdenha ou não se sente seguro dessa liberdade selvagem de que fala, assusta-o talvez..
9-Atrás, Íris espelhava talvez os desvios do Vilão, agora, pelo contrário, incentiva-o no desvio correctivo, (?) na direcção certa.
10-Íris continua, cada vez menos subtil, o seu trabalho terapêutico de monitorização. Desta vez é o medo que, na realidade, não está em Íris mas no Vilão como aqui ela lhe diz de forma subtil.
11-O Vilão continua os seus processos de intenção pois aparentemente apenas vai fazendo por ser, não é, efectivamente. É como que uma racionalização “impotente”.
12-Íris continua a dizer a primeira e única limitação e que é o próprio veículo, segundo ela, que contém e formaliza todas as cores e formas.
13-Íris choca-se da “neurose” do Vilão? Em Íris a sensação e a constatação do sentir estranham a racionalidade Vilã.
14-Terminado o trabalho de conversão do Vilão as polarizações invertem-se, novamente, e é agora íris que monitoriza, sugere, a racionalidade esquecida do Vilão. É como o culminar de uma dupla inversão, ou dupla inversão no écran que é Íris. O dissolver dos pólos, mais e menos, que prendiam e travavam o Vilão.
15-Íris, que é caos e movimento, descobre que até na primeira limitação do último véu em face, (que passou), não pode e não consegue estar; chega, enfim, a hora do Vilão se assumir como Vilão, de tomar e formar a essência, de morte.
16-O Vilão, embora não tenha abdicado da sua racionalidade, surge impregnado de movimento. A sua polarização inverteu-se primeiro para agora se afinar em premeditação.
17-Íris desespera de informação e é final e completamente integrada; o Vilão, a partir daqui, vai crescer na sua premeditação, paixão, de amor ; é a efectivação desta dupla inversão de écran que trouxe o Vilão da limitação à ilimitação e agora à deslimitação efectiva, à sua integração. Íris é o espelho invertido desta viagem.
18-É curioso, pois dir-se-ia que Íris se desdobra em si e se monitoriza como écran de si própria defronte ao Vilão.
19-O Vilão, seu “upgrade” feito, já vê à frente sem se tomar, prender.
20-É o Vilão que assiste e incentiva o combate de Íris com o seu écran de projecção civilizada.
21-É o medo que Íris (lá atrás) plasmou do Vilão que a toma de (se) invadir e ultrapassar o “seu” écran, como se o fantasma do Vilão se tivesse formalizado em écran de Íris agora que se autonomizou do Vilão.
22-Momento culminante em que Íris motivada e desencadeada pelo Vilão se precipita na dissolução e que é a dissolução do desvio e do fantasma do Vilão. A partir de agora Vilão e Íris, Íris e Vilão são apenas... amor... ou antes, “paixão amorosa”; “selvagem civilidade”.
NR 03