(Artaud.)
Totem à porta, olho morto
regressado neste cadáver,
este cadáver esfolado que lava
o horrível silêncio do teu corpo.
O ouro que sobe, o veemente
silêncio deitado sobre o teu corpo,
a árvore que carregas ainda,
e este morto que marcha em frente.
Vê como rodopiam os fusos
nas fibras do coração escarlate
e este grande coração onde o céu eclode
enquanto o ouro te imerge os ossos -
É duro campo de fundo o panorama
que se revela enquanto marchas
e a eternidade ultrapassa-te
pois não podes perder o ponto.
Invocação à múmia
Estas narinas de pele e osso
por onde começam as trevas
do absoluto, a pintura dos lábios
que cerras como uma cortina.
E este ouro que te brilha em sonho
e a vida que te despoja dos ossos,
e as flores deste olhar falso
junto por onde regressas à luz
Múmia, e estas mãos de fuso
para te revolver as entranhas,
estas mãos onde a sombra lamentável
toma a figura de um pássaro.
Tudo isto de onde se orna a morte
em estupor dum rito aleatório,
este borbulhar de sombras, e o ouro
onde nadam as tuas entranhas negras.
É por aí que te torno,
pela estrada calcinada das veias,
e o teu ouro é como a minha pena
e o pior é o mais sob testemunho.
Antonin Artaud - « La momie attachée et autre textes autour du Surrealisme ».