11 de dezembro de 2010

Os pretéritos.
A instalação das fugas.
O discernir dos objectos.
A interna regulação das convulsões.
De uma qualquer maneira.
Na mostra da face.
E das vidas reguladas.
Em sofrível conta das derrotas.
Que acertava como que na prudência do acerto.
Aqueles rostos antigos.
Dos olhares em volta fechada.
Nos estábulos.
Em manifesto de toda a consideração.
Nos rastos da noite.
No lugar.
Apenas num ensaio.
Das rupturas a fazer perto.
As conquistas de um novo mundo.
Em tomada das posições móveis.
Numa manutenção leve.
Do caminho.
Traços de um.
Deslizar das falas.

O desejo diverge em saltos de uma não permanência da imagem, em espaço “preenchido”.
Todas as primeiras vozes.
Aquele prolongamento da noite.
O encorpado fogo urgente.
Permanecera o sol.
Em qualquer impossível.
Forjado das certas condições.
E nas linhas insistentes.
Dir-se-ia povoado das imensas multiplicidades, distendera-se e, como continuara, cruzou, tentou pelo menos, incomodava a direcção, pensou:

não iria pensar,
todo o dia passara,
e aí regressaria,
em tempo,
e como era difícil,
e no entanto,
estava,
e porque não,
a primeira coisa que lhe não ocorria era nada,
passara como um vulto,
quem sabe,
estado,
em movimento,
em rotação,
algumas funções elementares,
a posição dos olhos,
agora não,
uma certa naturalidade,
os corporais solfejos,
dos primeiros indícios,
do movimento explosivo,
(as fibras e não sei quê),
esquecido,
de uma certa maneira,
nos pontos de apoio,
do movimento encadeado,
como se fizera,
o que fazer,
na próxima manhã,
ou um dia,
uma coisa sabia,
sabia-o,
e apresentava-se assim
- havia de não ler, pensou.

Discutia-se então a eterna questão dos universais indeterminados e como isso lhe aparecia tão profundamente indiferente. Como os mesmos afinal. Pensou então: apesar de tudo estes existem mesmo e independentemente de tudo o que se possa dizer.

- Parece-me um pouco arrogante da tua parte, diga-se.

Mas não, repara, toma como exemplo, simbólico claro, a “zona mesopotâmica”, qualquer animal que a veja, ou sinta se lhe amplificarmos o significado, reage de um modo que é universal entre os animais, logo, a sua existência, a da “zona mesopotâmica”, neste sentido abrangente claro, não depende de qualquer habilidade ou distinção feita pelo animal que lhe reage, até porque é incapaz de o fazer, mas o que é um facto é que reage e quer seja à vista, quer seja, inclusivamente, (e isto é importante), à própria sugestão da “zona mesopotâmica”, reage e pronto, logo existe, a zona, quero dizer.

Bom, bom, mas que feitio, apesar de tudo parece-me um “raciocínio” bastante “coxo”.

Que o é, sem dúvida. Mas faço-te a inversão da prova. Imagina: és um animal, não pensas, não pensas, logo, não existes, se não existes também as coisas que vês não existem, para ti, pois não possuis a habilidade de assim as considerar, reages, no entanto, à presença ou à própria sugestão da “zona mesopotâmica”, logo, e assim que te recolocares no lugar que te pertence, o de “homem hábil”, tens de considerar que, se estes elementos a que chamas universais, sejam eles aqui indeterminados ou não, têm, desse teu ponto de vista, “existência”, e, seja essa existência, que dessa tua posição não podes deixar de atribuir, nas coisas ou fora delas ou ainda existência distinta ou não nas ou das coisas, tens que considerar, dizia, ao observares o comportamento do dito animal, que, diga-se, está-se positivamente nas tintas para tudo isso, tens que considerar que, dizia, que, apesar do dito animal não ter o discernimento que possuis nessa tua qualidade, o que é um facto inquestionável, tens de considerar dizia, que, é um facto que este, animal bem entendido, reage, de facto, em função daquilo, ou de “alguma coisa”, a que tu chamas, e bem, um universal, seja este, como já disse, qualificado e situado como bem entenderes, e, dado que o animal, que desconhece, reage, às coisas, é porque algo está nas coisas, “isso” de que falamos, caso contrário, o animal, que não faz a mínima ideia do que é “isso”, não o faria, reagiria quero dizer, às coisas - caso contrário terás que considerar, pelo menos, a existência de singularidades universais na “mente” do animal, pois se não é às coisas que o animal reage algo teria que estar, nessa forma, na sua mente.

Julgava-te um pragmático, de qualquer forma, admiro a profundidade, mas parece-me coxo na mesma, embora tenha melhorado.

Hm, nasci em campo de ourique se ajuda, mas podes considerar um cheiro, um som, um simples olhar, são igualmente marcas elementares; e um cheiro é um cheiro, nas, das coisas.

Parece-me melhor.

Sim, afinal os animais não têm “zona mesopotâmica”, pelo menos que me lembre ou saiba, talvez o porco que é assim rosadinho, não sei, onde queria chegar, meu caro, é que esses universais, de que se fala, esse tipo especial de universais, bem entendido, são os elementos (e)feitos do jogo, da composição, e, como bem sabes, embora estejam ligados aos corpos que os vão carregando, ou nestes surjam, e apenas aí o possam fazer, têm, porém, uma existência universal, aqui e ali, dentro e fora da série, embora seja dentro desta, na minha opinião, que estão como peixe na água.

A ver, e quanto ao problema do acto acidental ou contingente?

Bom, brincas com coisas sérias, responder-te-ei como o posso fazer neste momento: fomentado na série - sem mais adiantar – tendo o seu ocasional corolário no desencadear-se que sai fora do tempo e da série, mas sabes, toda esta questão da “zona mesopotâmica” resolveu-se rapidamente em espirais de fumo azul que volteiam, distendidas, numa lenta ascensão rumo ao vazio, digamos apenas que, nesse sentido, do acto acidental, bem entendido, teriam sido dois dias e duas noites naquele lugar que, assim, se teriam resolvido sem resultados desse movimento maior, enfim, talvez na próxima.

Não percebo nada, é muito hermético.

É, bem sei.
“Alguma natureza é móvel ou mutável, porque pode carecer de alguma perfeição que lhe possa pertencer; logo, o termo do movimento pode começar e, desse modo, ser feito … “

D. Scoto ; Tratado do Princípio Primeiro – ed. 70 (trad. Mário Santiago Carvalho).

10 de dezembro de 2010

Um “contacto” à flor da pele.

Chega-nos uma angústia na face física da impossibilidade. O “encontro” do corpo de razão, físico, com o corpo de sentimento, imaterial, vice-versa; seja qual for o objecto o paradoxo mantém-se da própria divisão. Daí toda a irracionalidade, e os jogos, e a dança, a tragédia, o drama, enfim, a matéria do que nos apela, nós, o outro, (tu afinal). Este “combate” entre a materialidade do corpo e a imaterialidade do sentimento é a necessária condição de limitação da matéria, é própria produção da matéria, mais, é a própria matéria que, limitada, flui – é, realmente, o instante da impossibilidade das palavras, qualquer coisa que nos move à novidade, à dor, ao progresso das construções fechadas, o mais acabado dos mecanismos culturais dos diques e dos labirintos, das condutas, um oriente no ocidente. Este “reencontro” em corpo de luz é a imagem das delícias do regresso a uma “linguagem” sem observador onde todos os olhos se retiram. Esta utopia do amor suspende-se na impossibilidade que tira, dos seus rubores, a marca do progresso, da inovação. Um sonho do corpo implantado em doce recordação da luminosa reunião, vislumbre do momento da matéria, primordial implantação do instante da memória que vivemos, (como que de trás para a frente, ou vice versa), reflectido em angústia e como fora uma primeira pedra que é o instante da “separação” fundado como veículo da imagem, a imaginação. Sublimado momento da “violência”, uma saudade de nada. Bem real (no entanto) na sua força, civilizacional até. Inventamo-nos à razão dos corpos o excedente signo do mais poderoso dos mecanismos, afinal, como poderíamos viver sem amor, sem esta pluralidade. Todo o encontro assim carrega o nome de nós, seja um salto, um transporte, um combate … e um encontro assim é o poderoso íman que fundamenta todas as revoluções e avanços desta pluralidade que atinge as suas mais violentas convulsões da “arte” da decisão particular acabada, completa. No fundo é sempre esta busca, o encontrar-nos no segredo da noite, dos corpos da luz, em silêncio.
Como tardasse a uniforme adjectivação
Do peso
De qualquer coisa
Num dinamitado processo
Ao acaso da manhã
Nas sombras donde pudesse nascer
Um rio, semente dos acasos,
Das ligeiras maneiras
(prenúncio das marés vivas)
Das multidões desarvoradas
Que correm
Num esmagamento infalível
Aos ferros cruzados
Em queda,
Cantos do pormenor.
Dissera:
O adquirir da posse caminhara os lassos recantos do dia.
Subira o clamor das hostes.
Retirara-se. Surgisse.
Como morrera o amor.
E como pesa esta carne.
Como queima.
Como sobem as palavras.
Os represados rios duma vida.
E ainda é noite.
Como aprendi a despertá-la.
Ao activo das manhãs.
Que distribui uma certa lucidez.
(E não cai).
E esta vida dos muros.
E aquela inquietação…
Arde a fronteira
E nunca pára o território
Nas voltas em chama
Da noite ao preencher
De um novo vazio
Ao olhar sobre as casas.
Quem participa das abandonadas luzes.
Das linguagens duma exaltação das chamas.
Da súbita ausência, do permanecer.
Como vira o olhar do animal trespassado
Grito calado, em chama.
“Ah! A razão, a gravidade, o domínio das paixões, toda esta maquinação infernal que se chama reflexão, todos os privilégios pomposos do homem, quão caro custaram!”

F. Nietzsche: A Genealogia da Moral – Guimarães ed.
A cadência do desastre
E o tempo das plantações
Sejam os mesmos lugares
Os mesmos caminhos
As mesmas gastas vozes
Da silenciosa resposta
E como é doce
(Como sabiam os antigos).